sábado, 4 de fevereiro de 2012

Direitos Autorais: como garanti-los na Rede?

A Rede Mundial de computadores é ferramenta indispensável na vida de milhões de brasileiros. Além de fonte quase inesgotável de pesquisa, a Internet é um meio capaz de - com agilidade e eficiência - comunicar e entreter. Com sua expansão, tornou-se urgente o debate sobre os direitos dos conteúdos virtuais.

Escher - Drawing Hands (1948) 
No mundo, a discussão ganhou destaque nas diversas mídias. No Brasil, a Lei que “altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais” é a 9.610, aprovada em 1998. São apenas oito artigos, que não tratam exclusivamente da mídia online e, perto de completar 14 anos, se encontram em atraso.


Com intuito de sanar tal carência, um anteprojeto de Modernização da Lei de Direito Autoral (LDA), encontra-se na Casa Civil. O texto passou por consulta pública em 2010 e, apesar da atualização, não deve resolver os conflitos quanto ao Direito Autoral na Internet. Ela tratará da questão das violações nos diversos meios, mas sem ser específica. Assim - rádio, TV, impressos e internet - serão abordados sem a diferenciação devida.

O debate sobre a posse dos conteúdos virtuais deve ser longo e, para entendê-lo melhor, vale apresentar exemplos de como funcionou/ funciona a proteção da autoria em outras mídias. Para isso, entrevistamos Sergio Melo, professor-doutor da UFBA. Ele, que é também roteirista e tradutor, tratou de seus trabalhos na TV e na literatura, além de falar o que pensa sobra a questão na música e na Internet. Uma visão de quem teve obras envolvidas em diferentes situações.

Interatividade: Como começou sua experiência com Direitos Autorais?

Sergio Melo: De modo traumático. Ao voltar ao Brasil, depois de me formar como dramaturgo pela Scuola d'Arte Drammatica Paolo Grassi, de Milão, constatei que o único caminho para tentar um emprego, como roteirista na Globo, era o programa "Você Decide". Depois de uma tempestade mental bem cuidadosa, enviei dois argumentos verdadeiramente garimpados. Sem receber resposta, telefonei para a casa do chefe de redação e ouvi, além de elogios inúteis à minha escrita, que o senhor que recebera os meus argumentos não os poderia aproveitar porque alguém tinha enviado algo parecido. Um argumento que eu tinha desenvolvido, a partir de um livro que eu tinha acabado de traduzir sobre crianças portadoras de deficiências, foi ao ar algumas semanas mais tarde. O crédito da autora do argumento era atribuído a um parente colateral desse senhor. Furto ou coincidência? Embora tenha um palpite, nunca saberei ao certo.

Interatividade - Mas você chegou a ser contratado pela TV Globo. 

Sergio Melo - Sim, alguns anos mais tarde, como autor-roteirista. Lá, nenhum autor detém os direitos autorais de seus textos. Assim que você é empregado, assina um contrato pelo qual você abre mãos dos direitos de tudo o que fizer sob encomenda e o que vier a propor à empresa. Até aí tudo bem porque você está recebendo um salário e faz parte do jogo arriscar. Atualmente, a Globo se recusa a receber qualquer proposta de autores que não sejam contratados pela casa porque não quer mobilizar o seu jurídico com litígios sobre autoria de nada.

Interatividade - E não o incomodava ver seus trabalhos sem sua autoria?

Sergio Melo - Não pude achar maneiro não ter meu nome em alguns programas para os quais escrevi. Por exemplo, se você colocar o meu nome no IMDB, a maior base de dados referente a produções audiovisuais do mundo, vai verificar espantosamente que tenho apenas um crédito depois de ter trabalhado na televisão por seis anos. Para fins curriculares a própria Globo teve que me dar uma declaração comprovando meus trabalhos.

Interatividade - Com relação aos livros que traduziu, como funciona?

Sergio Melo - Tenho traduzido Pirandello para a editora paulista Alaúde – Tordesilhas. Desde o início acertei que os direitos da publicação iriam para eles, mas os direitos de encenação seriam meus. E, independentemente do que eu venha a fazer com esses direitos (por exemplo, doá-los a uma montagem que não tenha chances de lucrar com o empreendimento), faço questão de tê-los porque dediquei horas inimagináveis a esse trabalho. 

Interatividade - O que pensa da pirataria na produção musical?

Sergio Melo - Quem ganha rios de dinheiro são as gravadoras. Se pensarmos no lucro dos músicos, sejam autores ou intérpretes, esse é mínimo em comparação ao dos detentores dos meios de reprodução mecânica. Quando a pirataria dá uma mordida nesses tais lucros, de quem está no mercado vorazmente a fim de multiplicar os seus milhões, não tenha a menor dúvida de que o primeiro a perder será o músico.

Interatividade - E, finalmente, a Internet. Como veria seus trabalhos expostos na Rede?

Sergio Melo - A questão da Internet e direitos autorais estão em voga neste momento em que um novo veículo de comunicação se desenvolve a passos gigantescos. Ela precisa ser analisada com cuidado. A produção intelectual é uma produção como outra qualquer do ponto de vista de sobrevivência: há pessoas que lavam carros, outras que vendem trens-bala e outras que fazem poemas. Tudo isso é produção. Aliás, em grego, "poesia" quer dizer "produção". 

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